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21/01/2019

A esperança que resulta do desprendimento - Votos de um bom ano 2019 para todos os meus leitores



Post dedicado,a título póstumo, ao meu querido amigo, Joaquim Silva Pereira


Cara(o) visitante virtual,

Pela primeira vez desde que criei este blogue, em 2011, estive um ano sem nele escrever qualquer post. Não porque durante esse ano tenha perdido a esperança e nada conseguisse dizer sobre o assunto, mas porque muitas vezes a perdi e voltei a reencontrar na força deste blogue cujo alcance está muito para além do que eu possa escrever ou dizer porque a Esperança é ela própria uma força da natureza e um apelo que existe dentro de cada um de nós, eu apenas sou uma das pessoas que lhe confere importância conscientemente e que acha importante dar-lhe voz.

A pessoa que me impeliu a retomá-lo já partiu. O meu muito querido amigo Joaquim Silva Pereira, a quem dedico a reabertura deste blogue, como sei que ele muito valorizaria. Deixou-nos no fim de dezembro e enquanto me despedia dele, já sem vida física, vi um homem com uma nobreza de caráter e genuinidade comoventes. Um homem inteligente, culto, excelente profissional, avô e pai de família e verdadeiramente um grande amigo a quem a educação e sobretudo o ensino superior neste país devem uma vida de entrega e onde tive o enorme privilégio de o conhecer, de trabalhar com ele, de chefiar o seu trabalho e de com ele partilhar as conversas mais profundas e abertas, os pensamentos sem reservas, tudo o que a alma, o coração e a mente humanas produzem e que só com quem compreende e valoriza merecem ser partilhados.


(Joaquim Silva Pereira, ao centro discursando no lançamento do seu livro de poesia "No ventre da ausência" )

Joaquim, a título póstumo, obrigada pelo amigo que sempre foste e continuas a ser, como se vê, por este post que inspiraste no dia da tua partida. Porque tu me valorizavas como ser humano e como mulher.

Porque tu acreditavas neste blogue, muitas vezes mais que eu própria e por isso mesmo, em tua homenagem o retomo. Porque tu és um verdadeiro humanista e poeta, recentemente publicado, mas com tanta dádiva por publicar que eu tive o privilégio de conhecer.

De algum modo todas as experiências de vida precisam de vez em quando de algum afastamento, mesmo que motivado pelas circunstâncias do dia a dia, para as podermos ver de fora e avaliar o seu devido peso e valor. Houve uma circunstância de peso na minha vida que ia sempre soando baixinho ao meu ouvido que nada do que eu pudesse fazer tinha algum valor, que tudo eram banalidades, eu própria não passava de uma banalidade. E a consciência de se ser banalidade instala-se de forma insidiosa e perigosa porque não nos damos conta de que chega, traiçoeira e sorrateiramente infiltrando-se na nossa mente e criando-nos uma percepção de nulidade em que mesmo as coisas que mais gostamos de fazer e até, porventura, que melhor fazemos e onde damos o melhor de nós, passamos a ver e a pressentir que são meras e insignificantes banalidades como se algo mais que nós próprios ou alguém melhor que nós próprios pudesse avaliar a importância da dimensão do que somos e nos damos seja a quem for e seja ao que for.

O meu amigo Joaquim, foi uma voz contra-corrente em muita coisa na vida, um lutador consciente e empenhado na valorização da dignidade e do valor humanos e que mesmo no meu maior desalento, ainda que o não ouvisse por ser densa a negritude que me cobria e atrofiava a existência, e ele o soubesse, nunca desistiu de estar ao meu lado como amigo, ainda que simplesmente para almoçar em quase silêncio quando a vida de um ou do outro requeriam apenas a força da presença da nossa amizade, até aos últimos tempos em que apenas SMS nos uniam e uma última conversa telefónica que guardo na memória como um tesouro.


Pois bem, um ano volvido e sem que eu tenha feito um gesto seuqre, o presente blogue com o que cá fui depositando dos meus pensamentos e percepções sobre o ser humano, o sentido da vida e o sentido e valor da beleza do dia a dia, se o quisermos e tivermos condições físicas, psíquicas e espirituais para o apreciar, aumentou em mais de 1000 leitores dispersos por todo o mundo. Eu parei durante um ano de escrever. Mas a força da esperança que nele fui depositando, as pequenas sementes germinaram sozinhas levadas por este vento virtual a que retorno pela força da amizade que tem laços na eternidade. Escrevo este post que sei que o meu amigo Joaquim leria e comentaria e quase consigo imaginar os comentários que faria de tão bem nos conhecermos.

A leveza que resulta do desprendimento, foi a minha mais recente aprendizagem e fonte de serenidade e harmonia. Ao longo da minha vida em diferentes momentos e contextos tomei contacto com ideais religiosos, espirituais e culturais que de formas diferentes procuravam apelar ao desprendimento, mas de algum modo formatada numa sociedade contemporânea e numa economia competitiva muito presa a indicadores e resultados de projetos e atividades que empreendemos, nunca tinha conseguido captar o sentido desta palavra como de algum tempo para cá não apenas a capto, mas sobretudo, a vivo.
Desprendimento parecia-me algo como um desinteresse, irresponsabilização ou até desinvestimento em nós próprios e nos outros. Desprendimento era, para mim, inconscientemente uma palavra com uma carga negativa que repelia qualquer tentativa de abertura a um sentido mais súbtil e até comprometedor da mesma.
Desprender-me de resultados das minhas ações era algo que me parecia impensável assumir, porque não correto do ponto de vista das minhas responsabilidades como indivíduo integrado numa sociedade com a minha quota parte de responsabilidade pela mesma.
Não tinha ainda descoberto a verdadeira essência e força energética e libertadora do desprendimento.
Conhecia apenas o conceito de lutar e de resistir, de enfrentar os desafios da vida nos seus vários planos e de ser responsável por responder aos mesmos.



Não me ocorria sequer questionar-me se valeria a pena resistir, lutar e responder.
Não me ocorria sequer que houvesse outras respostas a equacionar, outros caminhos a procurar desvendar, no meu interior, mais em consonância comigo própria.
Não me ocorria que mesmo quando tudo procuramos fazer para que a nossa vida ou projetos sucedam como planeámos, sonhámos ou até nos empenhámos, não está ao nosso alcance o que resulta do caminho que percorremos.
Pela simples razão que não o percorremos nunca sozinhos.
Pela simples razão que nunca o percorremos da mesma forma em cada momento.
Pela simples razão que nunca o percorremos despojados das experiências e interações sociais atualizadas ao segundo.

Li recentemente um livro inspirador também nessa linha e que recomendo:



Na minha perspetiva as linhas espirituais às grandes religiões e aos profetas de todos os tempos são comuns e a sua linguagem é simples, clara e evidente porque é eterna, imutável e nos transcende. E, comos nós, seres humanos, que na pequenez das nossas limitações, ousamos acreditar que dominamos a linguagem do sagrado, seja em que religião for, mas o sagrado, o espiritual, a profundidade, chame-se-lhe o que se quiser chamar está dentro de nós e cresce, se o quisermos e permitirmos. E, a felicidade não é mais que acreditar nessa dimensão de infinita beleza, riqueza, diversidade, bondade, simplicidade e serenidade que existe dentro de nós.

Quanto a mim, para nós humanos, e por mim falo, a maior dificuldade no acesso à felicidade consiste precisamente em permitirmo-nos abandonar-nos à serenidade, ao equilíbrio natural entre nós, cada ser que nos rodeia, a natureza, o universo, e para quem é crente, que é o meu caso, um Poder Superior a que aprendi a chamar Deus.

Não poderia deixar de terminar este post com um poema do meu querido amigo Joaquim Silva Pereira recentemente publicado, felizmente ainda em vida dele e que sei que seria a forma que ele gostaria que me despedisse dele, precisamente porque esta despedida é uma partilha não do que ele foi, mas do que ele é, que continua muito presente em todos quantos tivemos o privilégio de o conhecer e, sobretudo, de ser seus amigos. Querido Joaquim, assim te revisito, uma vez mais:

Votos de um bom ano 2019 a todas as minhas leitoras e leitores e de uma inspiradora serenidade que vos tranquilize e faça impelir para o que há de mais belo dentro de cada um e à sua volta.

Um abraço virtual.

Célia Chamiça

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