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18/03/2012

Esperança… uma vez mais por Timor Lorosae


Caros visitantes virtuais,
Nunca fui a Timor Leste, mas trago este país no coração há muito tempo. É um país que sinto de algum modo que faz parte do meu património humano, talvez por me ter afetivamente associado à causa da libertação do povo timorense, como tantos portugueses.
No sábado passado realizaram-se eleições presidenciais neste que é um dos mais jovens países da comunidade internacional. Pela primeira vez Timor se aproxima do momento em que deixará de ter o apoio permanente da missão da Organização das Nações Unidas, pois terá atingido a estabilidade que permite garantir por si mesmo uma vivência democrática, em clima de segurança e respeito da ordem pública que assegure aos seus cidadãos que estes podem viver em liberdade e gerir, por si mesmos, o país por cuja independência tanto lutaram.
E, se não constitui para mim nenhum orgulho, mas antes vergonha a forma como Portugal salazarista se recusou obstinadamente e contra o direito à autodeterminação dos povos a deixar as suas províncias ultramarinas em África, já o mesmo se não pode dizer da atitude que tomou em plena democracia relativamente a Timor Leste. Com Timor, Portugal soube não apenas aceitar a independência daquele território, como ajudá-lo a libertar-se da sua anexação pela Indonésia, que o considerou a sua 27ª Província, 3 dias após a saída dos Portugueses de Timor, em 1975.
A coragem do povo timorense é comovente. Estão certamente na memória de todos as terríveis imagens do massacre, ocorrido em 12 de novembro de 1991, no Cemitério de Santa Cruz, onde o povo se tinha reunido para homenagear um jovem assassinado pelas autoridades ocupantes e que terminou num banho de sangue de 200 timorenses, abatidos a sangue frio sobre as campas brancas dos seus mortos.
Portugal em peso se levantou com indignação, por diversas ocasiões e com diversos gestos abanou a comunidade internacional para que não deixasse sucumbir aquele povo irmão sob a opressão bárbara da Indonésia que lançando napalm em doses maciças dizimou um terço da população timorense e destruiu o seu património geográfico e florestal nas zonas onde caiu.
Rui Marques, fundador e diretor da Revista “Fórum Estudante”, em 1992, congregou em torno desta nobre causa 120 estudantes de 23 países que, com o apoio do Presidente da República Portuguesa, Ramalho Eanes, e a ajuda de patrocínios, partiram no navio Lusitânia Expresso em direção a Díli para depositarem uma coroa de flores em homenagem aos mortos no massacre de Santa Cruz, chamando assim a atenção da comunidade internacional para a defesa indispensável da autodeterminação do povo de Timor. A missão chamava-se “Por Timor” e, após 3 meses de viagem, em 9 de março desse ano, partindo de Darwin foi sobrevoada por aviões militares indonésios e travada no dia 11 do mesmo mês por 4 vasos de guerra indonésios antes de entrar em águas timorenses.
Foram necessários 4 navios de guerra para afastar 120 estudantes… que lançaram a coroa de flores ao mar, prestando assim a sua homenagem e deixando ainda mais claro perante o mundo que este teria que tomar posição em favor da libertação do povo timorense.
Em Timor destacaram-se 3 figuras emblemáticas que para sempre marcarão a história daquele país: José Ramos Horta, jurista e porta-voz do povo timorense no exílio durante a ocupação da Indonésia, tendo depois vindo a ser Ministro dos Negócios Estrangeiros e depois Presidente da República de Timor Leste e D. Ximenes Belo, bispo de Díli, que elevaram com audácia e persistência as suas vozes a favor da construção da liberdade e da paz para o povo de Timor, ambos agraciados com o Prémio Nobel da Paz em 1996, por esses feitos heroicos. E, ainda, Xanana Gusmão, que foi chefe da resistência timorense contra a opressão indonésia e que teve depois a alegria de ver o seu povo libertado e de se tornar o seu primeiro Presidente da República e depois seu Primeiro-Ministro.
O poema de Xanana Gusmão sobre a realidade do povo timorense contra cuja opressão lutou é das peças mais bonitas que já li: “Esperanças Rasgadas”. Pode ouvir-se este poema declamado pelo próprio numa gravação disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=FZNk-Ztf_G4
Timor continuava oprimido, mas Portugal não o deixou cair no esquecimento. Em 1999, os Trovante gravaram uma comovente canção, “Timor”, com letra de João Muge e música de João Gil, ambas de intensa beleza, enriquecida com a fabulosa interpretação vocal de Luís Represas. A gravação que nunca me canso de ouvir está disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=EFtYyv9F3jw

A letra ainda hoje me toca profundamente numa comoção intensa pelo povo de Timor, símbolo também de outros povos que foram e continuam a ser oprimidos no mundo e que carecem do nosso apoio para encontrar a liberdade e a paz:

“Lavam-se os olhos nega-se o beijo
do labirinto escolhe-se o mar
no cais deserto fica o desejo
da terra quente por conquistar

Nobre soldado que vens senhor
por sobre as asas do teu dragão
beijas os corpos no chão queimado
nunca serás o nosso perdão

Ai Timor
calam-se as vozes
dos teus avós
Ai Timor
se outros calam
cantemos nós

Salgas de ventres que não tiveste
ceifando os filhos que não são teus
nobre soldado nunca sonhaste
ver uma espada na mão de Deus

Da cruz se faz uma lança em chamas
que sangra o céu no sol do meio dia
do meio dos corpos a mesma lama
leito final onde o amor nascia

Ai Timor
calam-se as vozes
dos teus avós
Ai Timor
se outros calam
cantemos nós.”

Em 8 de setembro de 1999 Portugal foi convidado a cobrir-se de branco em sinal de luto e paz em solidariedade com o povo de Timor Lorosae. Fizeram-se ainda três minutos de silêncio e um cordão humano de 10 km que ficaram na memória de Lisboa, de Timor e do mundo. A iniciativa chamou-se “Dia branco – Solidariedade por Timor” e foi uma iniciativa do Diário de Notícias, do Jornal de Notícias e da TSF que tiveram profunda adesão do povo português e que foi seguida pela comunicação social nacional e internacional.
Foi, pois, com grande emoção, que os portugueses assistiram ao nascimento da República de Timor Leste, em 20 de maio de 2002.
Agora, quase dez anos depois, o povo timorense prepara-se para eleger o seu próximo Presidente da República e consolidar uma democracia que vai amadurecendo e uma liberdade que vai saboreando.
A esperança reside nas suas crianças timorenses que felizes comemoram a liberdade e no povo de Timor que nos mostra o entusiasmo da participação cívica, porque poder votar é um direito inestimável e um dever de cada cidadão na construção do seu país. Nunca esqueçamos nas nossas democracias o imenso valor da esperança que representa essa liberdade, esse direito-dever de sermos senhores do destino do nosso país, com o poder do nosso voto.

Uma boa semana, caro visitante virtual,

C.C.

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